O artigo 213 do Código Penal conceitua o crime de estupro como o ato de "constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso". Dessa maneira, a estrutura do tipo é:
O crime de estupro pode ser cometido de duas formas:
A vítima poderá ser coagida a praticar ato sexual (comportamento ativo) ou a permitir que com ela se o pratique (comportamento passivo). Antes da alteração promovida pela Lei n° 12.105/2009, o crime de estupro era conceituado como o ato de constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça. Dessa maneira, o estupro somente era consumado através da conjunção carnal e só poderia ser cometido por homem contra mulher.
Além disso, o atentado violento ao pudor era concebido como o ato de constranger pessoa, mediante violência ou grave ameaça, forçando-a a praticar ou permitir que com ela se praticasse ato libidinoso diverso da conjunção carnal (sexo oral, anal, etc.). Ele poderia ser cometido por homem ou mulher, contra qualquer pessoa. Porém, com o advento da Lei n° 12.105/2009, o crime de atentado violento ao pudor foi absorvido pelo crime de estupro (observe-se que não houve abolitio criminis, não se suprimiu alguma conduta do Código Penal). Assim, o que antes era considerado atentado violento ao pudor é, agora, tido também como estupro, ou seja, independentemente de haver conjunção carnal ou não, haverá crime de estupro se a vítima for constrangida mediante violência ou grave ameaça a praticar ato sexual.
Vejamos abaixo o quadro comparativo da alteração promovida pela Lei n° 12.105/2009 no crime de estupro:
NOVA REDAÇÃO | REDAÇÃO ANTERIOR |
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TÍTULO VI DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL | TÍTULO VI DOS CRIMES CONTRA OS COSTUMES |
CAPÍTULO I DOS CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL | CAPÍTULO I DOS CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL |
Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso:
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.
Nomenclatura: estupro; Sujeito ativo: homem – possibilidade de coautoria ou participação de mulher - para a conjunção carnal; qualquer pessoa para outro ato libidinoso; Sujeito passivo: mulher – para a conjunção carnal; qualquer pessoa para outro ato libidinoso. | Art. 213. Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça:
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.
Nomenclatura: estupro; Sujeito ativo: homem – possibilidade de co-autoria ou participação de mulher; Sujeito passivo: somente a mulher. *Art. 214. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal: Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos. Nomenclatura: atentado violento ao pudor; Sujeito ativo: qualquer pessoa; Sujeito passivo: qualquer pessoa. |
Art. 213. ...
§ 1o Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos: Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos. § 2o Se da conduta resulta morte: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009) Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos. Formas qualificadas. | \*Art. 223. Se da violência resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos.
Parágrafo único - Se do fato resulta a morte: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 25 (vinte e cinco) anos. Formas qualificadas. |
Assim, não é exigido que haja contato físico entre a vítima e o agressor ou, ainda, entre terceiro, mas exige-se que a vítima seja envolvida de forma corpórea no ato libidinoso de alguma forma. Dessa maneira, a dignidade sexual não é ofendida apenas por atos físicos, mas também pelo transtorno psíquico que causa. Pode-se citar como exemplo o crime de estupro virtual, que embora não seja mencionado expressamente pelo Código Penal, tem sido aceito pela doutrina e jurisprudência. Ele ocorre quando o agente, mediante grave ameaça e através de meios digitais, constrange a vítima a praticar ato sexual virtual. Todavia, há quem entenda que, neste caso, não se configura o crime de estupro por não haver proximidade física entre a vítima e o agente. Existiria, assim, o crime de constrangimento ilegal.
Neste sentido, questiona-se: o beijo forçado pode ser considerado estupro? A doutrina se divide quanto à classificação de atos semelhantes ao beijo forçado. O entendimento majoritário é que o beijo forçado não constitui crime de estupro, mas contravenção de importunação ofensiva ao pudor, prevista no art. 61, do Decreto-Lei n.º 3.688/41 (Lei de Contravenções Penais). Contudo, o beijo forçado será configurado estupro se houver violência física empregada com a intenção de satisfazer a lascívia contra a vontade da vítima.
É o que decidiu o Superior Tribunal de Justiça, por exemplo, no Agravo Regimental no Recurso Especial n° 1705120/SC, no qual o agente "agarrou a vítima de 16 anos à força, beijou sua boca, mordeu seu rosto e passou a mão nos seios, nádegas e vagina, por cima da roupa, a fim de satisfazer a sua lascívia", o que foi justamente considerado estupro.
Convém ressaltar que o crime de estupro está previsto na Lei n° 8.072, de 25 de julho de 1990, que trata dos crimes hediondos.
Qualquer pessoa, seja homem ou mulher. Trata-se de crime comum.
Este crime admite coautoria e participação.
O coautor é aquele que emprega violência ou grave ameaça contra a vítima, sem realizar com ela a conjunção carnal ou o ato libidinoso. Será coautor, também, aquele que realizar, juntamente com outra pessoa, atos sexuais com a vítima.
Já o partícipe será aquele que estimular a prática do estupro, ainda que sem realizar qualquer ato executório nesse sentido.
O sujeito passivo é qualquer pessoa maior de 14 anos, apta a discernir.
Cabe ressaltar que, durante muito tempo, entendia-se que não era possível ocorrer estupro nas relações matrimoniais. Todavia, este entendimento não mais se sustenta. Há, inclusive, aumento de metade da pena se o crime for cometido por cônjuge ou companheiro, de acordo com o artigo 226, inciso II do Código Penal.
Deve-se mencionar, também, que o sujeito passivo poderá ser a prostituta, quando forçada a realizar ato sexual indesejado, ainda que mediante pagamento.
A consumação do crime de estupro se dá com a conjunção carnal ou a prática do ato libidinoso diverso, como o sexo oral, anal, o toque em regiões íntimas do corpo sem consentimento.
Admite-se a tentativa quando o agente emprega violência ou grave ameaça com a finalidade de realizar ato sexual com a vítima mas não o consuma por circunstâncias alheias à sua vontade. Trata-se, portanto, de crime plurissubsistente, aquele que se perfaz com vários atos, bastando que se concretize um deles para considerar-se iniciada a execução do crime. Caso não sejam exauridos todos os atos descritos no tipo, o crime não se terá dado por inteiro e se considerará tentado. (O crime unissubsistente, por sua vez, não admite tentativa pois se conclui inteiramente com um simples ato).
O elemento subjetivo é o dolo, consubstanciado na intenção de tolher a liberdade sexual da vítima mediante violência ou grave ameaça.
Figuras qualificadas:
Existe divergência doutrinária e jurisprudencial quanto à classificação do crime de estupro quando o agente, em um mesmo contexto, praticar contra a vítima conjunção carnal e ato libidinoso. Existem os seguintes entendimentos doutrinários:
Antes da Lei 12.015/2009 a ação penal prevista para os crimes sexuais era privada. Mas, com a lei 12.015/2009, para os crimes previstos no Capítulo I, do Título VI, do Código Penal, a ação penal passou a ser pública condicionada à representação da vítima. E para o caso de vítima menor de 18 anos ou vulnerável, a ação penal passou a ser pública incondicionada.
Entretanto, isso mudou mais uma vez com a Lei 13.718/2018, que determinou que nos Capítulos I e II, do Título VI do CP, a ação penal é pública incondicionada, ou seja, não depende-se mais da representação da vítima.
Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública incondicionada.