Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)
§ 1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria:
I - relativa a:
a) nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral;
b) direito penal, processual penal e processual civil;
c) organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros;
d) planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º;
II - que vise a detenção ou seqüestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro;
III - reservada a lei complementar;
IV - já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República.
As Medidas Provisórias (MPs) são normas com força de lei, editadas pelo Presidente da República em casos de relevância e urgência. Têm vigência imediata, mas dependem de aprovação do Congresso Nacional para se converterem definitivamente em lei.
Contudo, a própria Constituição impõe limites materiais ao conteúdo das MPs, listados no § 1º do artigo 62. Essas vedações visam proteger temas sensíveis que exigem debate legislativo mais amplo, ou cuja regulamentação demanda maior estabilidade jurídica.
O art. 62, § 1º da CF funciona como um freio constitucional ao poder do Presidente da República. Ele garante que temas de alta relevância social, jurídica e política não sejam alterados sem debate legislativo adequado. Ao vedar a edição de MPs nessas hipóteses, a Constituição protege o equilíbrio entre os Poderes, a segurança jurídica e os direitos fundamentais dos cidadãos.
O § 1º do artigo 62 estabelece matérias proibidas de serem tratadas por medida provisória. São quatro incisos, com o primeiro detalhado em alíneas:
É vedada a edição de MP sobre matéria relativa a:
É vedada MP que vise à detenção ou sequestro de bens, poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro. A redação tem como inspiração a experiência do Plano Collor (1990), quando foi feito o confisco da poupança por medida unilateral. A Constituição passou a proteger expressamente o patrimônio financeiro dos cidadãos contra esse tipo de ato.
MP não pode tratar de matéria que a Constituição exige que seja disciplinada por lei complementar. As leis complementares têm quórum qualificado (maioria absoluta) e são reservadas a temas estruturais, como normas gerais de direito tributário, organização do Ministério Público etc.
É vedada MP sobre matéria que já esteja disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto presidencial. A regra evita que o Presidente burle ou contorne a vontade do Parlamento usando sua própria iniciativa normativa.
O § 2º do art. 62 estabelece uma regra específica sobre o momento de produção de efeitos de medidas provisórias que tenham conteúdo tributário, mais especificamente aquelas que instituem ou aumentam impostos.
A finalidade dessa norma é proteger o contribuinte, dando-lhe previsibilidade e segurança jurídica, em respeito ao princípio da anterioridade tributária.
A medida provisória que cria ou aumenta imposto só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte, e somente se for convertida em lei até 31 de dezembro do ano em que foi editada. Ou seja, sem a conversão em lei até o final do exercício não haverá em validade no ano seguinte.
Suponha que uma medida provisória editada em julho de 2025 institui um novo imposto. Se essa MP não for convertida em lei até 31 de dezembro de 2025, não poderá produzir efeitos em 2026.
A própria norma traz exceções, ou seja, hipóteses em que a MP pode produzir efeitos no mesmo exercício, mesmo tratando de tributo. São os seguintes impostos, cujas MPs não se sujeitam à anterioridade anual.
Art. 153 da CF:
Esses impostos, por sua função extrafiscal e regulatória, admitirão alteração imediata, inclusive por medida provisória.
Já o Art. 154, II da CF se refere aos impostos residuais da União, instituídos por lei complementar, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados na Constituição. Esses impostos também podem ser regulados por MP, mas por exigirem lei complementar, a possibilidade prática é excepcional.
O § 2º reforça a anterioridade anual, que determina que um novo tributo só pode ser cobrado no exercício seguinte ao da publicação da lei que o instituiu (art. 150, III, 'b').
A regra do § 2º também impõe que a conversão da MP em lei se dê ainda dentro do exercício, para garantir essa previsibilidade. Se a conversão ocorrer em janeiro do ano seguinte, a cobrança só poderá iniciar no exercício seguinte ao da conversão.
Vale lembrar que a vedação e a limitação previstas no § 2º não se aplicam a taxas, contribuições ou outros tributos, mas somente a impostos.
O § 3º do art. 62 da CF/88 estabelece uma regra essencial sobre a validade temporal das medidas provisórias.
Prazo de vigência: As medidas provisórias devem ser convertidas em lei no prazo de 60 dias, contado da data de sua publicação.
Prorrogação: Esse prazo pode ser prorrogado automaticamente por mais 60 dias, apenas uma vez, caso o Congresso não tenha concluído a votação nesse período inicial. A prorrogação depende do disposto no § 7º, que regulamenta essa extensão.
Perda de eficácia: Se a MP não for convertida em lei dentro do prazo total (60 + 60 dias = 120 dias), ela perde eficácia desde a data da sua edição (efeito ex tunc), como se nunca tivesse existido no ordenamento jurídico.
Relações jurídicas: Apesar da perda de eficácia, a Constituição determina que o Congresso Nacional edite um decreto legislativo para disciplinar os efeitos jurídicos gerados durante o período em que a medida esteve em vigor.
As exceções previstas nos §§ 11 e 12 do mesmo artigo tratam de situações especiais, como emendas que resultem em texto integral substitutivo ou a aplicação imediata após a publicação da conversão em lei, e serão tratadas separadamente em outro material.
Este parágrafo trata especificamente da forma de contagem do prazo mencionado no § 3º. O prazo de 60 dias (e eventual prorrogação) começa a ser contado a partir da data da publicação da medida provisória no Diário Oficial da União.
Suspensão durante o recesso: Esse prazo fica suspenso durante os períodos de recesso do Congresso Nacional (normalmente de 23 de dezembro a 1º de fevereiro e de 18 a 31 de julho).
Importância da suspensão: A suspensão evita que o prazo corra em momentos em que o Congresso não está em funcionamento regular, o que garantiria maior segurança ao processo legislativo e respeito ao papel do Parlamento na análise da MP.
O § 6º determina que, caso a medida provisória não seja apreciada no prazo de 45 dias contados da data de sua publicação, ela entra em regime de urgência. Isso significa que, em cada Casa do Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado Federal), todas as demais deliberações legislativas ficarão sobrestadas (suspensas) até que a votação da medida provisória seja concluída naquela Casa.
Esse mecanismo força o andamento da medida provisória, evitando que o tema fique parado indefinidamente no processo legislativo. É uma forma de pressionar a pauta e garantir que a medida seja discutida dentro de um tempo razoável.
A lógica constitucional aqui é impedir que outras matérias legislativas sejam priorizadas em detrimento de uma norma que já está produzindo efeitos jurídicos no ordenamento.
Exemplo prático: Se uma MP é publicada em 1º de março, ela precisa ser analisada até 15 de abril. Se isso não ocorrer, a Casa onde ela estiver tramitando (Câmara ou Senado) ficará impedida de votar qualquer outro projeto, exceto se concluir antes a votação da MP.
O § 7º trata da possibilidade de prorrogação da vigência da medida provisória, de forma automática e uma única vez, por igual período de 60 dias. Essa prorrogação ocorre caso a medida provisória não tenha sido votada pelas duas Casas do Congresso Nacional dentro dos 60 dias iniciais contados da data de sua publicação.
Ou seja, a MP pode vigorar por até 120 dias no total: 60 dias iniciais + 60 dias de prorrogação, desde que não tenha sua votação concluída antes. É uma regra que busca garantir tempo razoável para que o Congresso aprecie a matéria, mesmo em situações de maior complexidade ou volume legislativo.
Importante: Essa prorrogação não depende de ato formal do Congresso ou do Presidente; é automática. Após o prazo inicial de 60 dias, se a votação não tiver sido finalizada, a MP continua válida por mais 60 dias, totalizando o prazo máximo constitucional.