Usurpação de Função Pública
O primeiro dos crimes praticados por particular contra a Administração Pública é a usurpação de função pública, previsto no art. 328 do Código Penal. Ele apresenta uma modalidade simples no caput e uma modalidade qualificada no parágrafo único.
Art. 328 - Usurpar o exercício de função pública:
Pena - detenção, de três meses a dois anos, e multa.
Parágrafo único - Se do fato o agente aufere vantagem:
Pena - reclusão, de dois a cinco anos, e multa.
Usurpar significa exercer indevidamente uma atividade pública de forma indevida. Quando se estuda o Direito Administrativo, verifica-se que o ingresso nos quadros da Administração Pública, salvo exceções, exige a aprovação em concurso público e o regular trâmite legal, o qual culmina na posse, a fim de preencher os postos com pessoas devidamente qualificadas, garantindo o regular funcionamento das atividades administrativas. Logo, a atuação de um sujeito que usurpa função pública, exercendo-a indevidamente, deve ser reprimida pelo Direito.
A modalidade simples, prevista no caput, admite os institutos despenalizadores da Lei nº 9.099/1995: transação penal e suspensão condicional do processo. A forma qualificada, aquela em que o sujeito aufere vantagem com a usurpação, admite somente o acordo de não persecução penal. O particular que desempenha uma função pública de forma indevida e um funcionário público que exerce função estranha a sua praticam o crime do art. 328 do Código Penal. Logo, é crime comum, que permite até mesmo um funcionário público como sujeito ativo.
Necessariamente, o sujeito praticará atos da função indevida (um único ato é capaz de consumar o delito, mas se não houver pratica não haverá crime). Portanto, é possível a tentativa, como quando o sujeito chega à função, mas não consegue praticar ato inerente a ela. Nesse sentido, didáticas são as palavras de Fernando Capez (2021):
No caso, o particular executa, ilegitimamente, atos de ofício, sem que detenha a qualidade de funcionário público, isto é, sem que tenha sido legalmente investido na função pública. Não basta tão somente que o particular se intitule funcionário público: é necessário que efetivamente pratique algum ato funcional. A mera atribuição da qualidade de funcionário público configura o delito do art. 45 da LCP.
A Lei nº 13.432/2017 regulamenta a profissão do detetive particular. Antes dela havia divergência doutrinária sobre a ocorrência, ou não, do crime de usurpação de função pública por este profissional. Desde a promulgação da lei, a atividade do detetive foi delimitada como aquela que planeja, executa, coleta dados e informações de maneira habitual, mas somente com informações não criminais. É possível que ele colabore com investigação penal em curso, desde autorizado pelo delegado de polícia, sob pena de ocorrência do crime do art. 328, CP.
É um crime que exige o dolo como elemento subjetivo. Os crimes só podem ser punidos de forma culposa se houver previsão neste sentido e se houver compatibilidade lógica entre a conduta e o conceito de culpa. Neste caso, não há qualquer previsão de modalidade culposa. Logo, a usurpação de função pública só é punida a título de dolo.
A modalidade qualificada importa na obtenção de vantagem pelo agente criminoso. Um terceiro beneficiário da vantagem será partícipe do crime. Importante diferenciar algumas situações: se o sujeito foi aprovado no concurso, mas ainda não tomou posse e praticou as condutas, seu crime é o de exercício funcional ilegalmente antecipado (art. 324, CP). Se o titular da função pratica ato suspenso, há crime de desobediência à decisão judicial sobre perda ou suspensão de direito (art. 359, CP). O art. 335 do Código Penal Militar prevê um crime específico de usurpação de função pública no seu âmbito.