Conforme estabelece o artigo 238 do Código Civil:

Art. 238. Se a obrigação for de restituir coisa certa, e esta, sem culpa do devedor, se perder antes da tradição, sofrerá o credor a perda, e a obrigação se resolverá, ressalvados os seus direitos até o dia da perda.

O artigo 238 do Código Civil de 2002 trata da hipótese de obrigação de restituir coisa certa que se perde, sem culpa do devedor, antes da tradição. A obrigação de restituir é uma espécie de obrigação de dar coisa certa. Nesse caso, o credor conserva a posse indireta da coisa, enquanto o devedor conserva a posse direta da coisa. Nessa situação, estabelece-se que o prejuízo recai sobre o credor, resolvendo-se a obrigação, ou seja, extinguindo-se a relação obrigacional. Contudo, ressalva-se ao credor o direito de exigir eventuais prestações devidas até o momento da perda da coisa.

Essa norma se insere no contexto das obrigações de restituir, como ocorre, por exemplo, em contratos de mútuo, comodato, depósito ou locação, e aplica a regra clássica segundo a qual "res perit domino", isto é, a coisa perece para o dono. Como se trata de restituição de coisa certa, presume-se que a propriedade ou algum direito real sobre a coisa já pertence ao credor, que, por isso, deve suportar os riscos da sua perda fortuita.

A perda da coisa, nesse contexto, deve ser involuntária e sem culpa do devedor. Caso contrário, se houver culpa do devedor, haverá o dever de indenizar o credor pelas perdas e danos. Sendo, porém, a perda fortuita (decorrente, por exemplo, de caso fortuito ou força maior), o ordenamento jurídico não imputa responsabilidade ao devedor, e a obrigação de restituir se extingue sem que se exija qualquer indenização, salvo quanto a obrigações anteriores já vencidas, como o pagamento de frutos, juros ou outras prestações acessórias até o dia da perda.

Portanto, o artigo 238 representa uma aplicação do princípio da ausência de responsabilidade sem culpa, além de refletir a lógica dos riscos contratuais conforme a titularidade da coisa. Enquanto o devedor tem a obrigação de restituir, mas não é mais o dono da coisa, o credor, como titular do bem, deve arcar com a perda quando esta ocorre de forma fortuita e antes da tradição. Trata-se, assim, de uma regra de justa distribuição dos riscos, que protege o devedor de ser responsabilizado por eventos alheios à sua vontade e que, ao mesmo tempo, reconhece os direitos do credor em relação às obrigações já exigíveis até o momento da perda.

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