O artigo 244 do Código Civil estabelece que:

Art. 244. Nas coisas determinadas pelo gênero e pela quantidade, a escolha pertence ao devedor, se o contrário não resultar do título da obrigação; mas não poderá dar a coisa pior, nem será obrigado a prestar a melhor.

O artigo 244 do Código Civil trata da escolha do objeto a ser entregue nas obrigações de dar coisa incerta, estabelecendo como regra geral que a escolha cabe ao devedor, salvo se o título da obrigação (contrato, testamento, sentença, etc.) atribuir expressamente essa faculdade ao credor ou estabelecer forma diversa.

A norma consagra um princípio tradicional do direito das obrigações: "genus nunquam perit", ou seja, o gênero nunca perece. Como a prestação envolve bens do mesmo gênero (ex: "vinte sacas de arroz tipo 1"), a perda de bens individualizados não compromete a execução da obrigação, desde que ainda existam outros bens do mesmo gênero e qualidade disponíveis. Assim, cabe ao devedor, por padrão, concretizar a obrigação, ou seja, individualizar e separar as coisas, momento a partir do qual a obrigação se torna de dar coisa certa.

Contudo, o artigo 244 impõe limites à liberdade do devedor ao realizar essa escolha: ele não poderá entregar a coisa de pior qualidade, nem será obrigado a fornecer a de melhor qualidade dentro do gênero indicado. Isso assegura equilíbrio e razoabilidade na execução da obrigação. Por exemplo, se o contrato prevê a entrega de "dez caixas de vinho tinto seco", o devedor não poderá escolher vinhos deteriorados ou de qualidade inferior ao padrão comum do gênero, mas também não será compelido a entregar os mais caros e requintados, desde que entregue bens adequados e condizentes com o gênero e a média do mercado.

Esse dispositivo preserva tanto os interesses do credor, garantindo que receberá bens em condição aceitável, quanto os do devedor, protegendo-o contra exigências desproporcionais. Além disso, reforça o princípio da boa-fé objetiva, pois exige comportamento leal e razoável na escolha da coisa a ser entregue.

Em suma, o artigo 244 estrutura o momento da concentração da obrigação de dar coisa incerta, conferindo ao devedor a iniciativa da escolha, desde que respeitados os limites de qualidade implícitos no gênero. A concentração da dívida consiste na escolha, na determinação da prestação, deixando a coisa de ser incerta e passando a ser certa. Trata-se de norma que promove a segurança jurídica e a equidade nas relações obrigacionais, assegurando que a prestação seja realizada com equilíbrio entre as partes.

Conforme disposto nos artigos 245 e 246 do Código Civil:

Art. 245. Cientificado da escolha o credor, vigorará o disposto na Seção antecedente. Art. 246. Antes da escolha, não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito.

Os artigos 245 e 246 do Código Civil de 2002 completam a disciplina das obrigações de dar coisa incerta, abordando os efeitos da escolha e os riscos envolvidos antes que ela se concretize.

O artigo 245 estabelece que, uma vez cientificado o credor da escolha feita pelo devedor, ou seja, após a individualização da coisa dentro do gênero e da quantidade estipulados, passam a vigorar as regras aplicáveis às obrigações de dar coisa certa, conforme previstas na seção anterior do Código. Isso significa que, a partir desse momento, a obrigação se "concentra", o objeto deixa de ser indeterminado e passa a ser específico. Com essa concentração, o regime jurídico da obrigação muda substancialmente, especialmente quanto à assunção dos riscos da perda ou deterioração do bem. Assim, depois da ciência do credor sobre a escolha, se a coisa vier a perecer por caso fortuito ou força maior, o risco normalmente passa a ser do credor, conforme o artigo 234, salvo se houver mora do devedor.

Por sua vez, o artigo 246 trata da fase anterior à escolha, estabelecendo regra clara quanto à distribuição dos riscos: antes que a escolha tenha sido feita, o devedor não poderá alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que por caso fortuito ou força maior. Isso significa que, até que haja concentração da obrigação, o risco permanece integralmente com o devedor. Essa previsão decorre da natureza da obrigação de dar coisa incerta, pois, enquanto não houver a individualização, presume-se que o gênero permanece disponível (genus nunquam perit), e o devedor ainda dispõe de meios para cumprir a prestação com bens equivalentes.

Em resumo, os artigos 245 e 246 tratam da transição entre o regime da obrigação de coisa incerta e o da coisa certa, delimitando com clareza o momento da escolha como divisor de águas. Antes dela, os riscos são do devedor; depois dela, com a ciência do credor, os riscos passam a se reger pelas normas da coisa certa. Tais dispositivos conferem segurança jurídica ao estabelecerem um marco objetivo para a mudança do regime obrigacional e asseguram o equilíbrio entre as partes, respeitando os princípios da boa-fé e da responsabilidade contratual.

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