Reforma católica: Vitória e Suarez
Introdução
Depois das ondas protestantes, assistimos ao que se costuma denominar "a reforma católica" ou "contrarreforma". Como resposta à Reforma Protestante, a igreja católica convocou o Concílio de Trento (1545-63), no qual reafirmou a autoridade do Papa, estabeleceu a catequização do Novo Mundo, criou uma relação de livros proibidos e o Tribunal do Santo Ofício, dentre outras medidas.
Houve intensa proliferação de obras de dogmática, inclusive abordando temas jurídicos. Aquele foi o período dos “descobrimentos” e da expansão marítima, bem como do florescimento cultural. É também a época de grandes intelectuais e artistas, como El Greco, Cervantes, Lope de Vega.
Direito internacional em Francisco de Vitória
Francisco de Vitória (1483-1546), teólogo espanhol, foi o fundador do humanismo cristão, com retorno às fontes gregas e romanas e ao tomismo. Sua principal obra é "De jure et justitia" com comentários ao tratado da justiça de São Tomás. Ademais, sua principal contribuição foi o desenvolvimento do jus gentium, isto é, a fundação do direito internacional.
Na Idade Média, os conflitos internacionais eram mediados pelo direito canônico, com uma arbitragem do papa. Pode-se citar como exemplo o Tratado de Tordesilhas. Contudo, isto se torna impossível após o surgimento dos Estados protestantes, que não reconheciam a autoridade papal.
Para solucionar esta controvérsia, Francisco de Vitória formulou o princípio de que os Estados devem respeitar mutuamente suas soberanias, não se imiscuindo em assuntos internos dos outros. Além disso, para Francisco de Vitória, os Estados devem admitir a livre-circulação dos homens e mercadorias dentro do território. Deve ser admitida, ainda, a liberdade de pregação e a liberdade dos mares e rios internacionais.
Francisco de Vitória elaborou o direito dos embaixadores, a proteção dos civis na condução da guerra e o direito dos índios. Estabeleceu, também, o pacta sunt servanda como fonte jurídica a partir dos tratados internacionais.
Francisco Suárez
Francisco Suárez (1548-1647), filósofo e jurista espanhol, expoente da Segunda Escolástica e da revitalização da filosofia de Tomás de Aquino. Ele tratará do problema das guerras de religião. Suas principais obras são “Comentários ao Tratado das Leis de São Tomás”, de 1612, e “Defensio fidei”, de 1613.
Um dos principais aspectos da filosofia de Francisco Suárez é o princípio da soberania dos chefes de Estado nos assuntos temporais balanceado pelo poder indireto do Papa. Este poder do Papa, de dirigir indiretamente, apenas do ponto de vista moral, a conduta política dos reis, é chamado de potestas directiva.
Ele surge das limitações ao absolutismo, assim, há a submissão dos reis às regras de direito natural e do direito das gentes (internacional) e aos tratados. Para Francisco Suárez, a origem do poder está em Deus, que o transfere para a sociedade civil, que constitui sua imagem e semelhança. É importante observar que o poder é transferido para a sociedade civil e não para os reis. Além disso, segundo ele, os indivíduos possuem sociabilidade. Com isso, podem realizar pactos. Um destes pactos é realizado com o príncipe, com a finalidade de transferir o poder dado por Deus. Assim, a origem do poder do príncipe é indireta.
É por esta razão que sujeição ao príncipe encontra limites no direito natural e nos bens espirituais da igreja. O que motivou a criação desta teoria foi o juramento de fidelidade exigido pelo Rei Jaime I da Inglaterra, o que gerou o questionamento quanto a quem o povo deveria ser fiel.
A solução encontrada por Francisco Suárez foi a separação dos bens temporais e bens espirituais, o que é um prenúncio do Estado laico. O conceito de bem comum elaborado por Francisco Suárez também é importante para a filosofia do Direito. Para ele, o bem comum consiste no bem da comunidade, somado ao bem dos indivíduos particulares. Isto porque o respeito ao próximo gera, consequentemente, o bem-estar de toda a comunidade. Dessa maneira, ao Estado cabe apenas a felicitas communis, relacionada a vida plena e justa do ponto de vista temporal. Este também é um prenúncio do Estado laico, já que o Estado deve preocupar-se com o bem-comum e não com a religião e salvação individuais.