Calvino e o Direito
O Pensamento de Calvino
João Calvino (1509-1564), teólogo francês, teve uma influência extraordinária em seu tempo. Sua doutrina teve início na cidade suíça de Genebra, espalhando-se para o norte até chegar na Alemanha, Holanda, Escócia, Inglaterra e para as primeiras colônias da América do Norte.
A principal obra de João Calvino é a instituição da religião cristã, de 1541, dedicada ao rei da França, Francisco I. Ele é posterior à Lutero, e vive em um ambiente universitário já marcado pelas ideias reformadoras.
João Calvino e Martinho Lutero: semelhanças e diferenças
Há aspectos semelhantes entre as ideias de Martinho Lutero e João Calvino: ambos são contrários ao direito concebido à maneira de Aristóteles e da Igreja Católica, porém, de modo mais completo e acadêmico.
Assim como Lutero, Calvino desconfia da filosofia antiga (Aristóteles, Platão, Cícero) pelo fato de ser pagã e não cristã e por desconfiar da própria natureza humana. Por isso, a reforma calvinista, contra a tradição escolástica, busca edificar uma moral cristã totalmente submetida às Sagradas Escrituras, sem influência da filosofia.
A diferença mais radical da reforma será expandir os preceitos morais cristãos com máximo rigor, tanto para leigos quanto para sacerdotes. Não há mais distinção entre monges e fiéis. Todos devem seguir os preceitos do mesmo modo. Ao mesmo tempo, os deveres religiosos católicos são abolidos: dever de ir à missa aos domingos, jejuar em certos dias da semana, doações para construção de igrejas, etc.
É afastada também a proibição da usura, isto é, da obtenção de lucros comerciais. João Calvino ordena aos ricos, todavia, que alimentem gratuitamente os pobres, paguem seu salário e prescreve a todos o trabalho.
Moral x Direito
Sua principal contribuição para a filosofia do Direito é a separação radical de moral e direito. Sua preocupação é primordialmente moralista e, secundariamente, jurídica. Com a expansão da moral para todos os indivíduos e todos os temas da vida pública e privada, o direito é "comprimido".
Assim como outros autores cristãos haviam observado desde Santo Agostinho, há poucos preceitos jurídicos que podem ser extraídos das Sagradas Escrituras. A solução adotada pela maioria era buscar soluções jurídicas na filosofia antiga e no direito romano. Ao negar essas duas fontes, o protestantismo só possui uma opção: o direito positivo. A atribuição de riquezas será da alçada do príncipe, isto é, do Estado. Cabe aos súditos apenas obedecerem.
Todavia, e este é o ponto importante, uma vez que os preceitos morais se dirigiam a todos os fiéis, eles também atingem os legisladores e juízes. Para estes, o direito deve visar sobretudo uma manutenção. A doutrina jurídica de Calvino é uma moral de conservar os bens, se valendo do direito apenas para que cada um "defenda" e "guarde" o que é seu.
A ideia de justiça em Calvino é, portanto, uma justiça providencial: tudo acontece e tudo é distribuído de acordo com a vontade divina. O reflexo disso para o direito é que não cabe mais aos juristas opinarem sobre valores morais. Assim como em Lutero, o direito passa a ser apenas um mecanismo de manutenção da ordem por meio da coerção.
Há um profundo rompimento do direito e moral. Dessa maneira, o positivismo jurídico torna-se cada vez mais próximo.
Saiba mais: a série de tirinhas Calvin and Hobbes (Calvin & Hobbes) foi inspirada em João Calvino, um dos expoentes da reforma protestante, Thomas Hobbes, filósofo inglês.