Exceções a Impenhorabilidade
Existem exceções legais à impenhorabilidade do bem de família. A Lei nº 8.009/1990 estabelece situações em que a impenhorabilidade do bem de família não se aplica, como se vê a seguir:
Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido
II - pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato;
III – pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida; (Redação dada pela Lei nº 13.144 de 2015)
IV - para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar;
V - para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar;
VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.
VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação. (Incluído pela Lei nº 8.245, de 1991)
Dessa forma, o imóvel adquirido por alienação fiduciária, por exemplo, não é impenhorável por débitos decorrentes dessa própria aquisição.
Dívidas decorrentes de pensão alimentícia também podem gerar a penhora do bem de imóvel, já que se trata de instituto que garante o mínimo existencial do credor de alimentos.
Impostos, taxas e contribuições devidas em função do imóvel tratado como bem de família podem também gerar penhora desse bem de família.
O bem de família oferecido em hipoteca como garantia também não pode gozar da impenhorabilidade do bem de família, visto que criaria uma situação de má–fé do devedor que ofereceu imóvel como garantia.
O bem adquirido com produto de crime não goza da impenhorabilidade do bem de família. Ressalta-se que a jurisprudência entende que essa hipótese de exceção à impenhorabilidade do bem de família não depende de sentença condenatória, mas apenas apenas da existência de conduta definida como crime, o qual gerou a aquisição do bem, conforme se verifica a seguir:
RECURSO ESPECIAL - EXECUÇÃO DE SENTENÇA CONDENATÓRIA, PROFERIDA EM DEMANDA NA QUAL SE PLEITEAVA A RESTITUIÇÃO DE VALORES DESVIADOS INDEVIDAMENTE PELA INSURGENTE DA EMPRESA ORA RECORRIDA. EMBARGOS DO EXECUTADO - PENHORA - BEM DE FAMÍLIA - EXCEÇÃO DO ART. 3º, INCISO VI, LEI N. 8.009/90 - IMÓVEL ADQUIRIDO COM PRODUTO DE CRIME - EXCEÇÃO À IMPENHORABILIDADE RECONHECIDA - POSSIBILIDADE. INSURGÊNCIA DA EXECUTADA. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Não se pode conhecer da violação ao artigo 535 do CPC, pois as alegações que fundamentaram a pretensa ofensa são genéricas, sem discriminação dos pontos efetivamente omissos, contraditórios ou obscuros. Incide, no caso, a Súmula 284 do STF, por analogia.
2. Embargos de declaração manifestados com o intento de prequestionar a matéria. Aplicável ao caso o teor da Súmula 98 do STJ: "Embargos de declaração manifestados com notório propósito de prequestionamento não tem caráter protelatório" 3. A Lei n. 8.009/90 elenca em seu artigo 3º, inciso VI, exceção à impenhorabilidade do bem de família nas hipóteses de bem adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.
3.1. Entre os bens jurídicos em discussão, de um lado a preservação da moradia do devedor e, de outro, o dever de ressarcir os prejuízos sofridos pelo credor em virtude de conduta ilícita criminalmente apurada, preferiu o legislador privilegiar o ofendido, em detrimento do infrator, criando tais exceções à impenhorabilidade do bem de família.
3.2. A exceção, na hipótese de bem adquirido com produto de crime, não pressupõe a existência de sentença penal condenatória, sendo suficiente a prática de conduta definida como crime e que o bem tenha sido adquirido com produto da ação criminosa.
3.3. No caso concreto, faz-se possível a penhora do bem de família, nos moldes do artigo 3º, inciso VI, primeira parte, da Lei 8.009/90, haja vista que o imóvel em questão fora adquirido com produto de crime.
4. Recurso especial parcialmente provido, apenas para afastar a multa aplicada com fulcro no artigo 538, parágrafo único, do Código de Processo Civil.
(REsp n. 1.091.236/RJ, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 15/12/2015, DJe de 1/2/2016.)
Outras situações
A execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens é uma hipótese de exceção à impenhorabilidade, já que no caso de sentenças penais, é possível haver necessidade de reparação civil, não podendo se privilegiar o ofensor em detrimento da vítima.
A fiança também constitui exceção à impenhorabilidade. Trata-se da hipótese mais controversa de exceção à impenhorabilidade do bem de família. Trata-se da fiança concedida como garantia de contrato de locação. O STF já firmou entendimento de que essa previsão legal não ofende a Constituição.
A constitucionalidade da exceção da fiança em contrato de locação foi reafirmada pelo STF no julgamento do RE 612.360, com repercussão geral (Tema 295), em que ficou fixada a tese de que “é constitucional a penhora do bem de família pertencente a fiador de contrato de locação comercial”. O entendimento majoritário foi de que, apesar da proteção conferida pela Lei 8.009/1990, a vontade do fiador em assumir o risco justifica a mitigação do direito à moradia.
Ademais, não goza da proteção do bem de família aquele que, sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar. Trata-se de situação que visa evitar a blindagem patrimonial de má-fé, com intenção de prejudicar credores. Nessas situações, é possível que o juiz anule a compra do imovel mais valioso.
Quanto às exceções à impenhorabilidade, por fim, é necessário mencionar que a jurisprudência é firme e pacífica no sentido de que essas hipóteses mencionadas são taxativas. O STJ já reiterou que as exceções do art. 3º da Lei nº 8.009/90 são taxativas, não se admitindo interpretação extensiva para ampliar hipóteses de impenhorabilidade. Assim, a proteção deve ser mantida nos casos não expressamente previstos pela lei, como se verifica a seguir:
PROCESSO CIVIL. DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ART 462 DO CPC. DIREITO SUPERVENIENTE. ERROR IN PROCEDENDO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL CIVIL DECORRENTE DA PRÁTICA DE ATO ILÍCITO. PENHORA DE BEM DE FAMÍLIA. LEI 8.009/1990. INTERPRETAÇÃO ESTRITA. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA.
1. Não ocorre violação ao art. 535 do Código de Processo Civil quando o Juízo, embora de forma sucinta, aprecia fundamentadamente todas as questões relevantes ao deslinde do feito, apenas adotando fundamentos divergentes da pretensão do recorrente. Precedentes.
2. O acórdão prolatado em agravo de instrumento torna preclusa a questão decidida, sendo certo que a preclusão é um fenômeno endoprocessual, ou seja, somente diz respeito ao processo em curso e às suas partes, não alcançando direito de terceiro, da mesma forma que nem sempre terá repercussões para as próprias partes em outros processos nos quais a mesma questão venha a ser incidentalmente tratada.
3. No caso em apreço, à toda evidência, verifica-se a existência de dois processos, os quais têm partes distintas - o executivo, em que figuram o condomínio e o cônjuge da recorrente, e o de embargos de terceiro, cuja relação jurídico-processual tem como atores o mesmo condomínio e a esposa ora recorrente, por isso não se há falar em coisa julgada.
4. É dever do magistrado, no momento de proferir a sentença, levar em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, a superveniência de fato ou direito novo, nos termos do art. 462 do CPC, incorrendo em error in procedendo o Tribunal que, ignorando tal providência, prolata acórdão que dá ensejo à coexistência de duas decisões inconciliáveis - uma no processo de execução, determinando a impenhorabilidade do bem de família, e outra nos embargos, estabelecendo a possibilidade de excussão desse mesmo bem.
5. Ademais, a Lei 8.009/1990 ostenta natureza excepcional, de modo que as exceções à regra geral da impenhorabilidade do bem de família são previstas de forma taxativa, sendo insuscetíveis de interpretação extensiva. Precedentes.
6. Recurso especial provido.
(REsp n. 1.074.838/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 23/10/2012, DJe de 30/10/2012.)