Carta OEA e Declaração Americana de Direito Humanos
Noções gerais e estrutura normativa
A Carta da OEA, também conhecida como Carta de Bogotá, é o documento constitutivo da Organização dos Estados Americanos, criada em 1948, e essa funciona como uma espécie de ONU para os Estados Americanos. Essa Organização, assim como a ONU, tem como finalidade internacionalizar os direitos humanos.
A Carta da OEA é um documento de intenções e, por si só, não pode ser considerada formalmente um tratado. Nesse ponto, é relevante ressaltar a importância histórica da Carta da OEA como fonte de interpretação secundária e, também, por justificar a criação da Declaração Americana de Direitos Humanos e Deveres do Homem. De toda forma, somente a partir da Declaração Americana de Direitos Humanos e Deveres do Homem será possível falar em força vinculante da Carta da OEA.
A Carta da OEA anuncia de forma genérica a proteção dos direitos humanos, não havendo menção expressa do termo proteção ou promoção dos direitos humanos na Carta. Há indicação, no preâmbulo, do termo “direitos fundamentais da pessoa humana”.
Apenas a partir da Declaração Americana de Direitos Humanos e Deveres do Homem houve detalhamento dos direitos protegidos. Como principais contribuições, pode-se mencionar:
- A concepção integrada dos direitos humanos, de forma a esclarecer que os direitos humanos abarcam direitos civis, econômicos, políticos, econômicos, sociais e culturais;
- Os direitos humanos como direitos inerentes à pessoa humana;
- A correção de direitos e deveres;
Curiosamente, a Declaração Americana de Direitos Humanos padece da mesma dificuldade da Declaração Universal. Muitos Estados alegavam que, por ser um simples protocolo de intenções, não haveria poder de exigir uma obrigação de fazer ou não fazer dos seus signatários. Essa interpretação perdurou por longo período, mas foi superada. Hoje entende-se que, embora não seja um tratado, tem relevância porque serve como fonte de interpretação e costume internacional.
Os direitos elencados na Declaração Americana são genéricos. No entanto, é possível verificar claramente os direitos de primeira e secunda dimensão dos direitos humanos.
Os direitos de primeira dimensão também chamados de direitos negativos são os direitos civis e políticos e exigem uma abstenção e afastamento do Estado. O Estado tem apenas a função de realizar a segurança pública e, em alguns casos, de educação.
A Declaração também apresenta os direitos de segunda dimensão que são os direitos econômicos e culturais. O liberalismo deixa de funcionar como um modelo sócio-econômico, surgindo a ótica do Estado de bem-estar social, em especial após a quebra da bolsa de valores nos Estados Unidos, em 1929. É nesse contexto que surge a necessidade de maior intervenção do Estado, para garantia de direitos.
Foi graças à Declaração Americana que o Pacto de San José da Costa Rica e o Protocolo de San Salvador tiveram ferramentas para cobrar respeito aos direitos humanos de primeira e segunda dimensão.
Em resumo, a Carta da OEA e a Declaração Americana de Direitos Humanos não são tratados, mas têm grande relevância.
Estrutura da Declaração Americana de Direitos Humanos
Atualmente, há dois órgãos fundamentais voltados para a proteção de Direitos Humanos. Os mecanismos de monitoramento (fiscalização) são desempenhados por esses dois órgãos:
- Comissão Interamericana de Direitos Humanos: fiscaliza o cumprimento de todos os direitos.
- Conselho Interamericano para o Desenvolvimento Integral: fiscaliza somente os direitos econômicos, sociais e culturais.
É importante ter atenção quanto à Corte Interamericana de Direitos Humanos. A Corte pertence ao Pacto de São José da Costa Rica, e embora integre o Sistema Interamericano, não é parte da OEA. Portanto, a Corte só integra o Sistema Interamericano para países signatários do Pacto de São José da Costa Rica. Isso porque, houve uma divisão histórica com a vigência do Pacto de São José da Costa Rica. Antes do Pacto, não havia tratado. Com o surgimento do Pacto, duas situações passaram a existir: países que integravam apenas a OEA e países que integravam a OEA e o Pacto de São José da Costa Rica. Logo, é possível que um país integre a organização dos Estados Americanos e não esteja submetido à Corte Interamericana de Direitos Humanos.
O Pacto de São José da Costa Rica também ampliou os poderes da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e transformou a Comissão Interamericana em um órgão de dupla função, acrescentando uma competência de juízo de primeira instância para a Corte, analisando os casos que merecem análise da Corte. Assim, perante a Declaração Americana, a Comissão Interamericana tem apenas função fiscalizatória, mas perante o Pacto de São José da Costa Rica a Corte também exerce um juízo de primeira instância. Novamente, essa competência inseria pelo Pacto só será exercida nos países signatários do Pacto.
Veja-se:
Quem integra a OEA e o Pacto de São José da Costa Rica | Quem integra a OEA mas não integra o Pacto de São José da Costa Rica |
---|---|
Estará submetido à Comissão, ao Conselho e à Corte Interamericana de Direitos Humanos |
Estará submetido apenas à Comissão e ao Conselho |
Comissão Interamericana é um órgão de dupla função:
|
Comissão Interamericana é um órgão de única função:
|
Esse é o caso do Brasil. O Brasil poderá ser julgado e condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por violação de direitos humanos. |
Esse é o caso dos Estados Unidos. Os Estados Unidos apenas estão submetidos à fiscalização da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, não podendo ser julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos ainda que haja violação de direitos. |
Diferenças entre a Declaração Americana e a Universal de Direitos Humanos
Relações de sujeição
Embora haja semelhanças entre os sistemas, nessa aula abordaremos as diferenças entre os Sistemas da Declaração Americana e a Universal de Direitos Humanos.
O que diferencia a Declaração Americana de Direitos Humanos é uma peculiaridade: essa Declaração estabelece relações de sujeição. Essa Declaração traz deveres do cidadão, relativos ao trabalho, assistência, previdência social, sufrágio e obediência a lei. Essas exigências não existem na Declaração Universal.
Nesse ponto, é válido relembrar as relações de sujeição, matéria normalmente estudada em Direito Constitucional, em direitos fundamentais.
Quando se fala em direitos fundamentais, fala-se das relações de sujeição. No âmbito dos direitos fundamentais, há relação de débito (o Estado é o devedor) e crédito (a sociedade é credora). Por isso, são cabíveis ações contra o Estado para que garanta os direitos fundamentais.
De maneira excepcional, essa relação pode ser invertida. O Estado passa a ser credor e a sociedade passa a ser devedora. Essas relações de sujeição podem ser:
- Comuns: quando todas as pessoas têm um dever ou mesmo quando determinado grupo tem esse dever. Exemplo: dever de votar.
- Especiais: trata-se de relações especiais que o Estado tem com determinadas pessoas. Exemplo: relação do Estado com um Servidor Público ou um preso
A Declaração Universal apenas estabelece direitos. Por outro lado, a Declaração Americana é mais detalhista nesse ponto. A Declaração Americana estabelece justamente essa relação de sujeição passiva.
Mecanismos de fiscalização
A OEA tem 5 mecanismos de fiscalização, os quais constituem a defesa multilateral dos direitos humanos, exercidos perante a Comissão Interamericana. São esses:
- Petições interestatais;
- Petições individuais;
- Investigações;
- Resoluções;
- Relatórios periódicos;
Os legitimados para cada tipo de fiscalização são diversos:
- Petições interestatais: os Estados são parte legítima;
- Petições individuais: organizações não governamentais são legitimados;
- Investigações: podem ser conduzidas de ofício por especialistas indicados pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos;
- Resoluções: são editadas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos e essas têm finalidade orientativa para cumprimento dos tratados;
- Relatórios periódicos: são apresentados pelos Estados-membros da Comissão Interamericana. São cabíveis, por exemplo, os “shadow-reports” em que há documentação enviada por organizações não governamentais para investigação de determinado Estado-membro.
Em razão desse rol de legitimados fala-se em defesa multilateral dos direitos humanos.