Hermenêutica x Interpretação e Quem utiliza a Hermenêutica Jurídica

HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO

É comum haver confusão entre hermenêutica e interpretação. Na maioria das vezes o aluno se questiona: “mas a hermenêutica não é a tarefa de interpretar uma mensagem?” Sim e não. Hermenêutica tem por objetivo a interpretação das mensagens contidas nos símbolos, sejam linguísticos, sejam pictóricos (como as placas de trânsito), mas ela não é a interpretação. A hermenêutica é o processo pelo qual a interpretação vem a acontecer.

Hermenêutica é, portanto, a análise, a ciência, o estudo aplicado à mensagem para se ter o maior grau de certeza de que a interpretação é a mais próxima do sentido pretendido pelo texto; no caso da hermenêutica jurídica, da mensagem pretendida pela lei.

HERMENÊUTICA E HERMENÊUTICA JURÍDICA

Como mencionado anteriormente, a hermenêutica encontra seu desenvolvimento no século XVII com Baruch Espinoza e, em seguida, com Friedrich Schleiermacher, ambos estabelecendo métodos para interpretação da Bíblia e das mensagens de D-s que as escrituras judaico-cristãs teriam para os homens. Lembra da função do Hermes na mitologia grega? Então.

A hermenêutica é uma ciência aplicada a várias disciplinas, como sociologia, metafísica, literatura, nos trabalhos de Martin Heidegger, Hans-Georg Gadamer, Wilhelm Dilthey, Paul Ricoeur, Jürgen Habermas, Gaston Bachelard, Gilles Deleuze dentre outros.

No caso da hermenêutica jurídica, o nome denuncia qual serão as fontes destas mensagens. As fontes das mensagens na hermenêutica jurídica serão as leis, os textos legais. Assim, a hermenêutica jurídica visa acessar, tornar compreensível e disseminar a aplicação do das leis, do modo mais justo, com o uso do bom senso, ao caso concreto.

A APLICAÇÃO DA HERMENÊUTICA JURÍDICA.

No mito de Hermes, o deus mensageiro era o responsável por fazer a tradução das mensagens do Olimpo para que os homens compreendessem. No caso da hermenêutica jurídica, cabe ao profissional do direito aplicá-la, ou mesmo ao estudante de direito, ou pesquisador, que utilizá-la para melhor compreender as leis.

Ambos pretendem com isso dar a melhor interpretação possível às leis dentro do nosso ordenamento jurídico, sendo este o conjunto ordenado, ou seja, hierarquizado, de normas jurídicas (regras e princípios) de um estado expressas em forma de lei.

Na prática, a hermenêutica jurídica é uma ferramenta para juízes, advogados, os promotores de justiça, os delegados, defensores públicos, enfim, todos quanto tenham a lei por instrumento de trabalho.

Esta interpretação é necessária pois, segundo Norberto Bobbio na obra Teoria da Norma Jurídica, as normas são gerais e abstratas. Sendo “gerais” as normas que são universais em relação ao destinatário, e de “abstratas” aquelas que são universais em relação à ação, cabe aos profissionais do direito adequar as normas ao caso concreto, verificando se o destinatário da norma se aplica ao sujeito do caso, e se a ação prevista na norma é a mesma do caso.

É normal que esta aplicação seja influenciada pelos valores, ideologias e visão de mundo daqueles que trabalham com a norma. Assim, é normal que para uma mesma lei existam diversas formas de interpretar, por vezes, valendo-se dos mesmos métodos hermenêuticos.

É por isso que a composição do nosso Supremo Tribunal Federal é ímpar, composto por 11 membros. Desta forma, em caso de empate nos entendimentos sobre o caso, cabe ao ministro presidente desempatar, exercer o chamado Voto de Minerva. Como na mitologia romana Minerva era a deusa da sabedoria, o voto de Minerva corresponde à escolha sábia ou correta em um caso envolvendo justiça.

Isto é necessário pois é bastante comum que haja divergência nas interpretações das leis aplicadas aos casos concretos, o que é chamado de subsunção do fato à norma, ou seja, o enquadramento do caso concreto à norma legal em abstrato.

Esta pluralidade de interpretações não só é comum, como é prevista pelo nosso sistema jurídico na medida em que, ao prever um sistema de recursos, ou seja, de revisão de decisões por instâncias superiores, permite-se que a cada instância recursal, aumentem os elementos de interpretação e convencimento do juiz quanto à aplicação mais justa da norma.

Em suma, é a hermenêutica que possibilita essa pluralidade de interpretações da lei em razão das particularidades dos fatos sociais pois, uma vez que a lei é geral e abstrata, cabe aos intérpretes chegarem à melhor conclusão e fundamentá-la nos princípios constitucionais, garantindo esta interpretação esteja integrada ao todo coerente do sistema jurídico.

Um juiz e um tribunal não podem aplicar a lei de uma forma que esta interpretação contrarie todos os princípios do ordenamento jurídico. Esta interpretação pecará por falta de integração ao sistema.

A hermenêutica, portanto, é que proporciona esta elasticidade à lei para que o direito seja garantido e, com isso, prevaleça a justiça.

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