Os requisitos da petição inicial estão previstos no artigo 319 do CPC. Vale reproduzi-lo:
Art. 319. A petição inicial indicará: I - o juízo a que é dirigida; II - os nomes, os prenomes, o estado civil, a existência de união estável, a profissão, o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica, o endereço eletrônico, o domicílio e a residência do autor e do réu; III - o fato e os fundamentos jurídicos do pedido; IV - o pedido com as suas especificações; V - o valor da causa; VI - as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados; VII - a opção do autor pela realização ou não de audiência de conciliação ou de mediação.
O inciso I traz o requisito do endereçamento ao órgão competente. O juiz, nesse caso, não figurará como pessoa física, mas como órgão competente para conhecer das questões trazidas na petição inicial. Vale ressaltar que a pessoa física do juiz apenas será relevante quando houver dúvidas acerca de sua imparcialidade. Do contrário, o juiz atuará como representante do Estado na atividade de prestação jurisdicional.
O endereçamento, contudo, pode conter equívocos. Nesses casos, se a petição inicial for dirigida a juiz absolutamente incompetente, ele deverá declarar de ofício essa incompetência, após ouvida a parte contrária (art. 64, §§1º e 2º do CPC), e remeter os autos ao juiz competente. Os casos mais comuns de incompetência absoluta são aqueles relativos à matéria (Justiça Federal, Estadual ou Trabalhista), às partes envolvidas (envolvimento da União, autarquia federal ou fundação federal no processo), à função ou competência hierárquica (se é do 1º grau ou em grau superior) e às hipóteses de impedimento, constantes do art. 144 do CPC. Vale informar que, geralmente, versam sobre questões de interesse público e, ainda que as partes concordem com o juízo escolhido, essa opção não pode ser aceita pelo juiz. Para facilitar o entendimento, podemos pensar o seguinte: o interesse público no regular andamento do processo deve ser sempre protegido, de forma que a incompetência absoluta poderá ser alegada a qualquer momento e grau de jurisdição, inclusive após a formação da coisa julgada (cabendo, neste caso, ação rescisória, nos termos do art. 966, II do CPC).
Se a petição inicial for dirigida a juízo relativamente incompetente, nos casos que versam sobre competência territorial (São Paulo ou Rio de Janeiro) e em razão do valor (Juizado Especial ou Justiça Comum), costuma-se falar em foro de eleição. Isso significa que as partes podem optar pelo juízo que mais lhes convêm. Nesse caso, o juiz não declarará a incompetência de ofício, mas apenas se for provocado pelas partes. O réu, por exemplo, pode suscitar a incompetência em preliminar de contestação, e o Ministério Público também pode levantar essa questão nas causas em que atuar (art. 65 do CPC). Se nada for alegado, haverá prorrogação da competência, ou seja, o juiz se manterá no julgamento da causa.
O inciso II traz o requisito de apresentação dos nomes, os prenomes, o estado civil, a existência de união estável, a profissão, o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica, o endereço eletrônico, o domicílio e residência do autor e do réu. A qualificação das partes e o endereço onde podem ser encontradas são importantes para que exista a mencionada delimitação subjetiva da lide, ou seja, a constatação, pelo juiz, de quem faz parte do processo.
Essa junção qualificação + endereço também permite que surja a capacidade de citação do réu. Dessa forma, com tais informações, é possível chegar até a parte contrária e permitir que tenha consciência do processo que está sendo movido contra ela. Entretanto, pode acontecer de o autor não possuir todas as informações. O que o juiz, nesse caso, deve fazer? Ele deve colaborar com o processo.
Isso está previsto no art. 6º do CPC e consubstancia o chamado “dever de colaboração” das partes no processo, de forma que se espera do juiz um posicionamento ativo para auxiliar o autor na consagração do direito de acesso à justiça.
O dever de colaboração e facilitação da prestação jurisdicional estão também previstos nos parágrafos do art. 319 do CPC:
§ 1º Caso não disponha das informações previstas no inciso II, poderá o autor, na petição inicial, requerer ao juiz diligências necessárias a sua obtenção. § 2º A petição inicial não será indeferida se, a despeito da falta de informações a que se refere o inciso II, for possível a citação do réu. § 3º A petição inicial não será indeferida pelo não atendimento ao disposto no inciso II deste artigo se a obtenção de tais informações tornar impossível ou excessivamente oneroso o acesso à justiça.
O inciso III indica a necessidade de trazer à petição inicial os fatos e fundamentos jurídicos do pedido que, juntos, são conhecidos como “causa de pedir”. É por meio da explicação dos fatos que antecederam a petição inicial que o juiz entenderá a relação entre as partes, e é através dos fundamentos jurídicos (base legal) que o juiz também verificará de que forma os direitos e deveres das partes deveriam se concretizar.
É importante pontuar que a mera indicação dos fundamentos legais é insuficiente para preencher esse requisito. Isso porque o Código de Processo Civil adota a teoria da substanciação, que significa, basicamente, que é mais importante que o autor explique de forma clara e concisa os fatos e os fundamentos jurídicos que os sustentam, em detrimento da indicação específica de artigos de lei (fundamentos legais). Se porventura o autor indicar quais os dispositivos legais são aplicáveis ao caso, essa indicação não vincula o juiz, que necessita do detalhamento de fatos e fundamentos jurídicos para formar seu entendimento.
A doutrina ainda apresenta algumas subdivisões da causa de pedir, podendo ela ser próxima (fundamentos jurídicos), remota (fundamentos de fato), ativa (aquela sem a qual não haveria o direito, o fato de onde ele nasce - o casamento, o acidente) e passiva (a lesão que o autor sofreu para que a demanda fosse judicializada - o inadimplemento, a falta de indenização).
Importante não confundir fundamentos legais e fundamentos jurídicos. Enquanto o fundamento legal diz respeito à norma jurídica que o autor entende cobrir sua pretensão, o fundamento jurídico especifica qual o enquadramento jurídico dos fatos narrados. Trata-se, a grosso modo, da a causa de pedir remota, mediata.
Vale ressaltar que o juiz tem poder de enquadrar os fatos e o fundamentos jurídicos em base legal diferente daquela indicada pelo autor. Desde que não os altere, pode entender que outro artigo da lei, por exemplo, se aplica àquele caso. Nessa hipótese, a doutrina defende que o juiz deve dar às partes o direito de manifestação, em especial atenção ao dever de colaboração e à vedação das decisões-surpresa (art. 10 do CPC).
O inciso IV exige que o autor apresente o pedido e suas especificações na petição inicial. O pedido é exatamente o que o autor busca com aquele processo, o resultado que pretende obter. O pedido pode ser dividido em mediato - o bem da vida que pleiteia, como uma indenização, um medicamento, um bem material objeto de disputa, ou uma nova situação jurídica - e imediato, que é a própria prestação jurisdicional requisitada ao Estado-juiz.
O valor da causa é extremamente relevante para definição da competência, do procedimento a ser adotado e dos honorários advocatícios. Em razão dessa importância, sua ausência pode levar à extinção do processo.
A fixação do valor da causa é realizada por meio de dois critério: a fixação legal ou obrigatória - nos casos em que a atribuição do valor já foi previamente definida pelo legislador - ou pela fixação voluntária, nos casos em que não há determinação legal e o valor parte de uma estimativa razoável do autor.
Ademais, é possível impugnar o valor da causa em preliminar de contestação, segundo os ditames do art. 293 do CPC, sob pena de preclusão.
Por fim, vale ressaltar que a importância do valor da causa é de cunho processual e fiscal. No Juizado Especial Cível, ela é determinante para a fixação de competência (pois aceita causas de até 40 salários mínimos) e também para a obrigatoriedade ou não de advogado (quando a causa valer até 20 salários mínimos, a própria parte é dotada de capacidade postulatória); é base de cálculo para multas e outras penas imposta pelo juiz (como litigância de má-fé); pode ser o parâmetro para a fixação dos honorários do advogado (Art. 85, §§ 2º e 6º, do CPC); do ponto de vista fiscal, o valor da causa é a base de cálculo para o pagamento das custas.
O inciso VI apresenta o requisito de que o autor especifique as provas com que pretende demonstrar a veracidade dos fatos alegados, tendo em vista que elas são capazes de influenciar o convencimento do juiz sobre as alegações das partes. Cabe lembrar que a Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso LVI, considera inadmissíveis as provas ilícitas.
Sobre esse tema, parte da doutrina sustenta que a petição inicial pode conter um pedido genérico de produção de provas, sem especificar como e quais devem ser realizadas, porque é apenas com a contestação do réu que serão verificados os pontos controvertidos da lide. Assim, os fatos que não forem contestados pelo réu serão admitidos como verdadeiros, e os que não forem serão objetos de produção de prova (os chamados pontos controvertidos). Por tal motivo, fala-se em pedido genérico na inicial e, após a contestação, a especificação das provas que se pretende produzir. Outra parcela da doutrina, contudo, sustenta que é possível, desde a petição inicial, o autor especificar ao menos um tipo de prova.
Em aula, foi trazido para análise o REsp 329/034/MG, em que foi admitido o requerimento de provas em dois momentos processuais distintos: na petição inicial, em pedido genérico, e após eventual contestação, quando as partes são chamadas, pelo juiz, a especificarem as provas que pretendem produzir. Ademais, vale informar que “o silêncio das partes em responder ao despacho de especificação de provas faz precluir o direito à produção probatória, implicando desistência do pedido genérico formulado na inicial”.
O último requisito apresentado pelo art. 319 do CPC, no inciso VII, traz a necessidade de o autor indicar se opta ou não pela realização de audiência de conciliação ou de mediação. O novo CPC trouxe como inovação o caráter obrigatório da audiência de conciliação, nos termos do art. 334, como uma tentativa de facilitação do acesso a uma resposta jurisdicional satisfatória. Partindo-se da ideia de que diversas lides podem ser resolvidas por meio da autocomposição, a obrigatoriedade da audiência de conciliação ou mediação foi inserida no novo diploma.
E esse método alternativo de resolução de conflitos é tão relevante que, diante do silêncio do autor na petição inicial, presume-se que este é favorável à realização da audiência de conciliação ou mediação. Além disso, se houver manifestação favorável nos casos em que a autocomposição não é admitida, o juiz corrigirá o procedimento e determinará a citação do réu para apresentar contestação, e não para comparecer à audiência de conciliação/mediação (art. 334, §4º, II do CPC).
Por fim, outro requisito da petição inicial é aquele constante do art. 320 do CPC. Nele, há o dever do autor instruir a petição inicial com os documentos indispensáveis à propositura da ação. Esses documentos podem ser dividido em substanciais e fundamentais. Os primeiros são aqueles exigidos pela lei e sua ausência levará à determinação, pelo juiz, de emendar a petição inicial. Se o autor não proceder à emenda, haverá o indeferimento da petição inicial, com extinção do processo sem resolução de mérito (art. 485, I, CPC). Quanto aos documentos fundamentais, estes dizem respeito à comprovação dos fatos alegados pelo autor na peça vestibular. Se não apresentados, levam à declaração de improcedência do pedido.
Em aula, vimos um trecho do REsp. 1.130.704/MG, em que se apresenta essa diferenciação. Assim, a ausência de documento indispensável exigido por lei, após determinação de emenda, leva à inépcia da petição inicial, com posterior indeferimento (art. 330 do CPC), e a ausência de documento que comprova o fato constitutivo do direito do autor leva à improcedência do pedido.