Contribuições da Doutrina Estadunidense

Interpretativismo vs. Não interpretativismo

O debate originalmente se estabeleceu na doutrina estadunidense era pautado pela tensão entre a doutrina interpretativista, mais conservadora, e a não interpretativista, mais moderna. 

Interpretativismo

Em linhas gerais, os adeptos dessa corrente mais conservadora entendem que ao intérprete não cabe inovar no texto normativo. Pode ser dividida em 2 subcorrentes:

  • Originalismo: Parte do pressuposto de que tudo o que está consagrado pela Constituição é fruto da convergência de vontade dos cidadãos (exercício da soberania popular). Portanto, é preciso que se busque sempre pelo sentido que o legislador originário deu à norma, já que ele nada mais fez do que consagrar a vontade popular por meio da positivação. Portanto, não poderão ser criados direitos novos por meio da interpretação uma vez que isso significaria contrariar a vontade do povo. 
  • Textualismo: Aqui, o intérprete deve buscar o significado da lei, e não do legislador constituinte. Para que isso ocorra, a interpretação deve se utilizar apenas dos elementos que a própria Constituição traz em seu texto. Essa corrente se diferencia do formalismo que já estudamos em razão da necessidade de se interpretar o texto de maneira não restritiva. Aqui, admite-se que somente o que está literalmente escrito não comporta a complexidade da atividade interpretativa. 

Não-Interpretativismo

É uma posição mais progressista, que considera não ser legítimo exigir que o constituinte originário imponha seus valores de maneira absoluta às gerações futuras. Isso porque o que antes era valor fundamental, pode não mais ser na atualidade. Por isso considera que essa geração deve ter liberdade para escolher a visão de mundo que quer ver prevalescer, seja incorporando novos direitos, seja dando nova interpretação aos direitos consagrados pelo legislador originário. Nesse sentido, o Poder Judiciário deve ser protagonista nas mudanças sociais e na incorporação de novos direitos à Constituição. 

Minimalismo

As decisões judiciais devem ser voltadas apenas ao estritamente necessário à resolução de litígios individuais. São portanto decisões dotadas de alto grau de superficialidade e estreiteza. Isso porque as decisões não devem se aprofundar na análise dos argumentos mais amplos que envolvem determinado caso. 

Além disso, os tribunais devem sempre evitar resolver casos que envolvam assuntos que não estejam suficientemente maduros. Todo caso, portanto, deve ser apto a imediato julgamento. 

Os adeptos dessa vertente entendem que ao juiz não cabe emitir opiniões consultivas, demonstrando sua opinião pessoal sobre situações. A função do juiz é decidir nos casos concretos em que seja competente, tão somente. Além disso, as decisões devem manter certa coerência, sempre que possível respeitando os precedentes judiciais. 

Essa postura passiva do julgador, para os entusiastas da teoria minimalista, é de grande valia para a promoção da democracia, uma vez que há menos chances de interferência judicial no processo político. Isso porque, além de sua postura discreta com relação às opiniões pessoais, as causas decididas pelo juiz sempre serão aquelas as quais já houve debate suficiente na esfera democrática. 

Essa posição é adotada de forma majoritária pela doutrina estadunidense, por demonstrar ser a mais adequada. 

Maximalismo

Para essa corrente, as decisões devem formular regras gerais e abstratas, utilizáveis em julgamentos futuros pelo aplicador do direito. Ao contrário da corrente anterior, as decisões do juiz, para o maximalismo, serão dotadas de grande profundidade e amplitude. Todas as questões de direito deverão ser amplamente discutidas pelo juiz. 

Apesar de a vertente Minimalista ser a mais aceita, o Maximalismo é uma boa opção para ordens jurídicas em que ocorre inadequado funcionamento do processo democrático, já que essa posição traz mais segurança jurídica, dado que o ambiente em que o direito se desenvolve muitas vezes é dotado de desconfiança nas respostas institucionais. Portanto, ter um judiciário que discute mais profundamente sobre alguns temas se mostra mais vantajoso nessas situações, já que a própria população ainda não desenvolveu a cultura de debater esses temas de forma ampla.

Pragmatismo Jurídico

Há várias vertentes do Pragmatismo, mas a fonte que emana as demais é a do teórico Richard Posner. Pra ele, a decisão jurídica deve visar o resultado mais razoável possível diante do caso concreto. Essa razoabilidade deve ser aferida não só diante das consequências daquele caso em específico, como também diante das consequências que aquela decisão gerará no sistema jurídico como um todo. Portanto, a decisão deve levar em consideração as consequências tanto individuais quanto sistêmicas. 

Um ponto importante dessa teoria consiste no fato de que a decisão deve ser baseada principalmente a partir dos fatos e consequências daquela decisão. O juiz, para Posner, não tem a obrigação de dar sempre uma resposta correta. Na verdade, a busca judicial deve ser por decisões razoáveis. 

Partindo desse pressuposto, o método divide-se em duas etapas:

  • Definição do objeto da norma: Esse objeto será definido tanto pelo texto em si quanto pela realidade social conformada pelo texto normativo. 
  • Escolha do melhor resultado: Nessa etapa o juiz pensará na decisão mais apta a alcançar o resultado pretendido pela norma (ou seja, a razoabilidade). 

Atenção! O Pragmatismo não pode ser confundido com Consequencialismo.

Pragmatismo Consequencialismo
O que o juiz deve buscar, além de obter as melhores consequências possíveis em sua decisão, também seguir as regras e princípios que regem aquele sistema jurídico. Aqui, a discricionariedade é limitada, e o limite é o próprio sistema de normas. O juiz deve buscar as melhores consequências em sua decisão, independentemente de seguir ou não o sistema de regras e princípios do ordenamento jurídico. Aqui, portanto, a discricionariedade não encontra limitação.

Essa teoria é adotada por boa parte dos juízes estadunidenses, como modelo de atuação. 

Leitura Moral da Constituição (Ronald Dworkin)

A leitura moral da constituição elaborada por Dworkin é um modelo construído com base em regras, princípios e políticas.

Dworkin parte do princípio de que direito e política não podem ser confundidos, uma vez que têm suas peculiaridades, mas também não existe possibilidade de um campo não interferir no outro. Isso porque quem profere as decisões judiciais são pessoas, e como tais, são sujeitas a interferências do espectro político em seu juízo moral. Dworkin portanto não acredita na possibilidade de haver um juiz totalmente imparcial. 

A inovação do Dworkin é considerar que essa interferência não é necessariamente nociva à interpretação, desde que esse posicionamento seja abertamente exposto e debatido de forma honesta e transparente. Dessa forma, a fundamentação para Dworkin é de suma importância para a qualidade da decisão proferida pelo julgador. 

Para Dworkin a interpretação deve ter duas limitações:

Atender à integridade do direito e respeito a um sistema único e coerente de Justiça e Equidade. Essa integridade tem 3 dimensões:

  • Principiológica: Decisões judiciais devem ser determinadas por princípios, e não por acordos políticos ou estratégias políticas.
  • Vertical: Coerência com relação a órgãos do judiciário distintos. Ou seja, é o dever de o julgador demonstrar a coerência daquela decisão com relação aos precedentes já julgados anteriormente.
  • Horizontal: Coerência com relação às próprias decisões semelhantes daquele mesmo juiz que está proferindo a decisão. É uma coerência interna.

Aspectos semânticos e históricos: Não é possível ultrapassar daquilo que é tratado no texto constitucional.

Dworkin usava a metáfora do “romance em cadeia”, que eram romances circulados em folhetins escritos por diversos autores, a fim de demonstrar a necessidade de coesão entre os intérpretes e os legisladores. Dessa forma, é importante que os legisladores e juízes do presente analisem as interpretações e contexto legal do passado a fim de manter certa coerência interpretativa. 

Importante destacar, por fim, que essa teoria não serve para qualquer caso judicial que necessite de interpretação. A construção de Dworkin é voltada aos chamados Hard Cases, casos complexos, com problemática mais recente ainda não enfrentada pelos tribunais. 

É famosa a expressão “Juiz Hércules” que remete à postura do juiz para essa teoria. Nada mais é do que a postura pautada pela busca de coerência, que segundo Dworkin, faz com que o juiz consiga alcançar as respostas mesmo aos casos mais complexos. É o juiz que deve buscar a resposta concreta. Não há espaço para discricionariedade, aqui. 

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