Aspectos Materiais de Superendividamento - Inadimplência do Consumidor
O superendividamento é uma condição financeira que afeta milhões de consumidores, que se caracteriza pela incapacidade de uma pessoa pagar todas as suas dívidas sem que isso comprometa o mínimo existencial. Adiante, vamos entender a origem desse problema e como isso influenciou na criação da Lei do Superendividamento.
Qual é a origem do problema?
O superendividamento surge de um estado de desequilíbrio contínuo entre as várias ofertas de crédito e a capacidade de pagamento do consumidor, geralmente aquém à oferta.
Esse desequilíbrio não ocorre aleatoriamente: é produto de um sistema financeiro e de uma sociedade de consumo que muitas vezes incentiva a assunção de dívidas sem a devida consideração pela capacidade de pagamento a longo prazo dos indivíduos.
O problema estrutural do superendividamento afeta não apenas os indivíduos endividados, mas também a sociedade como um todo. Nesse caso, cria-se um cenário que pode gerar riscos muito grandes aos indivíduos e à economia, portanto, é necessária a intervenção de políticas públicas, através de legislações que protegem o consumidor e regulamentam o mercado de crédito, como o caso da lei 14.181/21.
Qual o papel dos entes?
Empresas privadas, principalmente as instituições financeiras, têm um papel significativo neste problema estrutural. Elas frequentemente contribuem para o superendividamento por meio de concessão de créditos ou cobranças de taxas de juros excessivas.
O poder judiciário tem um poder fundamental para mudar e criar políticas que combatam esse problema. O Supremo Tribunal Federal (STF), no Tema 698, reconhece a possibilidade do judiciário determinar a implementação de políticas públicas para garantir direitos fundamentais. e isso implica que, em casos de superendividamento, se outras medidas falharem, o judiciário terá que agir para assegurar a justiça econômica e social.
Em suma, o superendividamento do consumidor como problema estrutural destaca uma falha sistêmica que requer uma abordagem multidimensional para sua resolução, incluindo a reforma de práticas de mercado, educação financeira, legislação protetiva e, quando necessário, a intervenção do poder judiciário.
A inadimplência do consumidor é um problema estrutural?
A inadimplência do consumidor, especialmente em um contexto pós-pandêmico, representa um desafio estrutural para a economia brasileira. A análise do Mapa da Inadimplência de julho de 2023 revela que mais de 71 milhões de pessoas estão inadimplentes, o que corresponde a 43,72% da população. A maior incidência de inadimplência foi registrada no segmento de "Bancos/Cartão de Crédito", representando 29,54% do total.
Estes dados alarmantes apontam para um problema sistêmico que vai além das decisões e atitudes individuais, refletindo uma questão que está intrinsecamente ligada às estruturas econômicas e sociais do país.
A oferta de crédito é frequentemente vista como uma ferramenta de estímulo econômico, mas quando mal administrada, pode levar ao superendividamento. O contexto da pandemia da COVID-19 exacerbou essa situação, pois o aumento do desemprego e a crise econômica resultante levaram muitos a recorrer ao crédito como uma solução temporária, sem perceber que isso poderia agravar ainda mais sua condição financeira a longo prazo.
Diante deste cenário preocupante, foi promulgada a Lei nº 14.181/2021, que altera disposições do Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto do Idoso, visando oferecer mecanismos legais para combater o problema do superendividamento e proteger os consumidores de práticas abusivas, além de promover a educação financeira e a renegociação de dívidas de forma sustentável. Vejamos, abaixo, as garantias fomentadas:
X - prevenção e tratamento do superendividamento como forma de evitar a exclusão social do consumidor.”
VI - instituição de mecanismos de prevenção e tratamento extrajudicial e judicial do superendividamento e de proteção do consumidor pessoa natural;
VII - instituição de núcleos de conciliação e mediação de conflitos oriundos de superendividamento.
XI - a garantia de práticas de crédito responsável, de educação financeira e de prevenção e tratamento de situações de superendividamento, preservado o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, por meio da revisão e da repactuação da dívida, entre outras medidas;
XII - a preservação do mínimo existencial, nos termos da regulamentação, na repactuação de dívidas e na concessão de crédito;
XIII - a informação acerca dos preços dos produtos por unidade de medida, tal como por quilo, por litro, por metro ou por outra unidade, conforme o caso.
A normalidade gerada pelo endividamento excessivo demanda uma atuação coordenada do Estado para criar condições de superação dessa crise estrutural.
A seguir, vamos adentrar nos aspectos materiais da lei 14.181/2021, seus impactos e seu detalhamento.