Princípios do Direito Ambiental

O Direito Ambiental é uma disciplina recente na ordem jurídica e é considerado um Direito Fundamental de 3ª geração. Os direitos de 1ª geração são aqueles que preceituam a liberdade dos indivíduos em contraponto às limitações impostas pelo Estado, podendo-se citar, como exemplos, os Direitos Civis e Políticos. Já os direitos de 2ª geração caracterizam-se pelos Direitos Sociais, os quais reivindicam do Estado a proteção de determinados direitos, como, por exemplo, o direito à educação, moradia, entre outros. Por fim, os chamados direitos de 3ª geração compreendem os direitos supra individuais de titularidade indivisível (direitos difusos), ou seja, trata-se de direitos que transcendem o pleito de um único indivíduo ou de um grupo organizado, podendo-se citar como exemplos o direito à proteção ao meio ambiente, o direito à paz e ao desenvolvimento.

Nessa aula, serão apresentados alguns princípios específicos do Direito Ambiental, os quais fornecem a autonomia desse referido ramo do Direito, uma vez que a especificação principiológica é o que fornece estruturação e autonomia às disciplinas jurídicas.

O art. 225 da CF constitui o apoio central aos princípios ambientais, como se verá a seguir:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:

I -  preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;

II -  preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;

III -  definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;

IV -  exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;

V -  controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;

VI -  promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;

VII -  proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.

§ 2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.

§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

§ 4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.

§ 5º São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.

§ 6º As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.

1) Princípio do meio ambiente ecologicamente equilibrado como Direito Fundamental:

Da primeira parte do artigo 225 da CF (Todos têm direito), extrai-se que, conforme já mencionado, o Direito Ambiental é um Direito Fundamental de 3ª geração em razão da sua abrangência difusa, destacando-se que tal direito assiste a todo o gênero humano.

Por meio ambiente ecologicamente equilibrado entende-se o meio ambiente sem poluição, com salubridade e higidez, a fim de se garantir o direito à vida e a dignidade da pessoa humana.

Ademais, a partir do referido artigo, conclui-se que o meio ambiente é de uso comum do povo (uso este não exclusivo e não concorrente), não sendo possível, portanto, apropriação do meio ambiente por determinado grupo ou indivíduo.

MEIO AMBIENTE COMO BEM DE USO COMUM DO POVO

Importante pontuar que, como já sabido, o regime de bens no direito brasileiro rege-se pelo Código Civil. Entretanto, a compreensão do meio ambiente como bem de uso comum do povo não se confunde com a classificação do Direito Civil de bens públicos de uso comum. Isso porque o meio ambiente NÃO é passível de desafetação, o que é permitido para os bens públicos classificados como de uso comum (ruas, praças, estradas), que permitem a desafetação, com a conversão em bem dominical e, portanto, passível de alienação. Assim, essa classificação civilista não se adequa ao Direito Ambiental, uma vez que não é possível a desafetação ou apropriação do meio ambiente.

Além disso, pela concepção civilista, a titularidade dos bens públicos classificados como de uso comum é das pessoas jurídicas de direito público (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), o que não se admite no Direito Ambiental, uma vez que, como já mencionado, o meio ambiente é de titularidade difusa.

Em suma, entende-se que o meio ambiente, bem de uso comum do povo, é um bem jurídico autônomo, difuso, indisponível e insuscetível de apropriação.

2) Princípio da Solidariedade Intergeracional e Princípio da Cooperação:

Ainda do art. 225, "caput", da CF. Em sua parte final, extrai-se o Princípio da Cooperação e o Princípio da Solidariedade Intergeracional.

Primeiramente, o Princípio da Cooperação dispõe a necessidade de comprometimento dos agentes públicos e privados para a proteção do meio ambiente e a promoção do desenvolvimento sustentável. Destaca-se também o Princípio da cooperação ambiental no âmbito internacional, a qual é objeto de alguns dos princípios da Declaração Rio/92. Decorrente desse princípio está a previsão, no art. 225, "caput", da CF, do dever do Poder Público e da coletividade em proteger o meio ambiente, obrigação essa comum e obrigatória. Ademais, cita-se também a Competência Executiva Comum entre as pessoas de Direito Público, prevista no art. 23 da CF, que previu a responsabilidade comum entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios no que diz respeito à matéria ambiental no campo executivo.

Já o Princípio da Solidariedade Intergeracional se relaciona com o dever, previsto no art. 225, "caput", da CF, de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. Assim, compete às gerações atuais utilizarem-se dos recursos naturais disponíveis sem que seja comprometida a capacidade de sobrevivência das gerações futuras, a fim de que essas tenham acesso aos recursos naturais atualmente disponíveis e, ainda, de preferência, em melhores condições.

3) Princípio do Desenvolvimento Sustentável:

Destaca-se, ainda, o Princípio do Desenvolvimento Sustentável, decorrente de uma leitura conjunta entre o art. 170 da CF, que trata dos Valores da Ordem Econômica (livre iniciativa, trabalho digno e proteção ao meio ambiente), juntamente com o art. 225, também da CF, que dispõe acerca dos Valores da Ordem Social (defesa do meio ambiente como direito fundamental).

Por desenvolvimento sustentável, entende-se um processo pelo qual a exploração dos recursos, a direção dos investimentos financeiros e os rumos do desenvolvimento tecnológico se organizam de modo que se atendam às necessidades humanas e seja respeitado o meio ambiente. Nesse sentido, o STF (ADI nº 3540) entendeu que a atividade econômica não pode ser exercida em desarmonia com os princípios destinados a tornar efetiva a proteção ao meio ambiente; a incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica, ainda mais se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerias, àquele que privilegia a defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação (art. 170, VI, da CF).

Ademais, tal princípio estipula, também, que a atividade econômica deve se desenvolver com o tratamento digno da mão-de-obra, além do respeito ao meio ambiente. Há, portanto, a conexão entre a economia, meio ambiente e trabalho, não havendo de se falar em desenvolvimento sustentável, por exemplo, no caso do emprego de mão-de-obra análoga à escravidão, ou no caso de esgotamento dos recursos naturais de determinada região.

4) Princípio da Reparação Integral ou Poluidor-Pagador:

O Princípio da Reparação Integral, também conhecido como Princípio do Poluidor-Pagador, tem sua previsão expressa no art. 225, §3º, da CF. Com base nesse princípio, surge a obrigação de reparação dos danos causados pelos infratores, destacando-se que tal responsabilidade é de natureza objetiva, ou seja, sua caracterização independe de comprovação do elemento volitivo de culpa. Assim, diante do nexo causal entre o poluidor e o prejuízo ambiental causado, situa-se a necessidade de responsabilidade do infrator, sem a necessidade de se discutir a intenção ou a conduta dele.

Destaca-se que o princípio do poluidor-pagador possui, segunda a doutrina, duas feições: uma de caráter preventivo, ao buscar evitar a ocorrência de danos ambientais, e outra de natureza repressiva, já que, ocorrendo o dano, o poluidor é responsável objetivamente por sua reparação. Assim, para evitar que externalidades ambientais negativas – ou seja, tudo aquilo que se encontra fora do processo de produção, como, por exemplo, a poluição – sejam suportadas pela comunidade, impõe-se ao empreendedor produtor a adoção de medidas preventivas (ex: tratamento de resíduos; instalação de filtros de gases), bem como, ocorrendo danos ambientais, exige-se do produtor a obrigação de reparar, uma vez que a responsabilidade civil ambiental é objetiva (aspecto repressivo).

5) Princípio do Usuário-Pagador:

Já o Princípio do Usuário-Pagador, apesar de conter nomenclatura semelhante ao princípio anteriormente mencionado, difere-se por estar ligado a atividades permitidas (lícitas). Tal princípio é decorrência da necessidade de quantificar economicamente os recursos naturais, a fim de se evitar a ausência de cobrança pela sua utilização. Assim, estipula-se a necessidade do usuário direto de determinados recursos ambientais suportar os custos econômicos de possíveis impactos causados no meio ambiente, mesmo que lícita a atividade empreendida. Portanto, tal cobrança do usuário pela utilização de recursos naturais (cobrança esta que deve ser prevista em lei) não se trata de uma indenização, aproximando-se mais a uma espécie de compensação entre os impactos causados nos ecossistemas pelo uso dos recursos naturais. Como exemplo, cita-se a utilização da água, a qual é considerada um bem dotado de valor econômico, a fim de que o consumo de água seja mais moderado.

6) Princípio da Prevenção e Princípio da Precaução:

Como princípios que visam a antever possíveis impactos ou danos ambientais, em busca da proteção do meio ambiente, podemos citar o Princípio da Prevenção e o Princípio da Precaução.

A prevenção está ligada à tentativa de mensurar riscos ambientais conhecidos e, portanto, passíveis de mensuração, como por exemplo, a exigência de se realizar um estudo prévio de impactos ambientais de uma atividade em determinada região (art. 225, IV, da CF). Por risco conhecido, entende-se aquele identificado através de pesquisas ambientais, ou aqueles conhecidos por resultados de intervenções anteriores. Como exemplos decorrentes da prevenção, destaca-se: Estudo Prévio de Impacto Ambiental; Licenciamento Ambiental e Auditorias Ambientais.

Já a precaução liga-se a riscos ambientais ainda incertos, não estudados cientificamente, como é o caso da manipulação de organismos geneticamente modificados, cujos riscos não são totalmente conhecidos pela humanidade (art. 225, V). Assim, na precaução, há a ausência de pesquisas ou informações a respeito dos potenciais efeitos de determinada atividade no ambiente e na saúde humana.

JURISPRUDÊNCIA

Em matéria do Direito Ambiental, o STJ já decidiu pela inversão do ônus da prova quando se tratar do princípio da precaução. O referido tribunal decidiu que cabe ao produtor empreendedor demonstrar a segurança de sua atividade potencialmente perigoso ao meio ambiente e à saúde humana. (Nesse sentido, tem-se as decisões: REsp nº 972.902/RS, DJ 25.8.2009; REsp nº 1.237.893/SP, DJ 1.10.2013).

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