‘PL da devastação’: entenda o Projeto de Lei aprovado pela Câmara que dispensa licenciamento ambiental
Publicado em: 18/07/2025 por Guilherme Carvalho - Equipe
Trilheiros e trilheiras, trazemos no post de hoje uma apresentação do projeto aprovado pela Câmara do Deputados que cria a Lei Geral do Licenciamento Ambiental que repercutiu nas redes sociais e gerou uma série de debates.
A Câmara dos Deputados aprovou na madrugada desta quinta-feira (17), o projeto que cria a Lei Geral do Licenciamento Ambiental, que ficou conhecido nas redes sociais como o “PL da Devastação”. O texto foi aprovado com 267 votos a favor e 116 contrários. Agora segue para sanção presidencial.
A Lei, se sancionada, altera, integralmente, o processo de obtenção de licenças ambientais no país. O texto gerou inúmeros debates e fomentou a participação social. Quem o defende, alega que o objetivo seria o de desburocratizar e acelerar obras que beneficiam a economia e geram renda e trabalho, enquanto instituições de defesa ao meio ambiente e o próprio Ministério do Meio Ambiente, apontam que o avanço do projeto significa um retrocesso para a política ambiental do país, além de aumento da impunidade para criminosos ambientais, ameaça a integridade e sobrevivência de comunidades locais e aumento de crimes ambientais irreparáveis.
"A proposta aprovada na Câmara impõe retrocessos estruturais e cria vulnerabilidades socioambientais e insegurança jurídica, podendo inclusive ser questionada na justiça por setores da sociedade. A sociedade deve se manter mobilizada e o governo vai continuar trabalhando porque precisamos consolidar um marco legal do licenciamento ambiental que esteja à altura de nossas imensas riquezas naturais, da tradição jurídica brasileira, tanto em defesa do meio ambiente, quanto na segurança e previsibilidade para os empreendimentos a serem licenciados, e alinhado com os princípios da sustentabilidade e da proteção ambiental", afirmou a Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, durante entrevista ao jornal Folha de S. Paulo.
Mas o que é o projeto e o que muda na prática?
Na prática, o que se votou foi um substitutivo — texto que altera substancialmente o texto inicial da proposta — que incorpora no Projeto de Lei 2159/21, 29 emendas elaboradas pelo Senado Federal. O relator da proposta, deputado Zé Vitor (PL-MG), votou favorável.
Vitor ainda afirmou que as emendas do Senado contribuem para estabelecer regras claras e objetivas para o licenciamento ambiental. "Após amplo debate com todos os setores interessados que buscaram um diálogo construtivo em prol de um texto equilibrado e que contribua com o desenvolvimento sustentável do País, o projeto se mostra apto", garantiu.
A nova legislação traz mudanças profundas em diferentes eixos da pauta ambiental:
1. Criação de Licença Ambiental Especial: cria um novo modelo de licenciamento ambiental, chamado de Licença Ambiental Especial (LAE), que poderá ser concedida mesmo se o empreendimento for efetiva ou potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente. A aprovação ainda será acelerada, com prazo máximo para emissão de 12 meses, com validade de cinco a dez anos.
2.Dispensa de licenciamento: o texto elimina a necessidade de licença para a ampliação de estradas, atividades agropecuárias, tratamento de água e esgoto, e pequenas barragens de irrigação.
3.Licença por adesão: criação de um licenciamento ambiental simplificado por adesão e compromisso (LAC), que poderá ser solicitado pelo interessado sem necessidade de estudos de impacto.
4. Mineração: Nas minerações de grande porte e/ou alto risco, não serão mais observadas normas do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) até que uma lei específica trate sobre o tema.
5.Renovação automática: permite que licenças ambientais sejam renovadas automaticamente por meio de autodeclaração, desde que não haja mudanças na atividade ou nas regras.
6. Desmantelamento de instituições de fiscalização (Ibama e do Conama): o projeto retira a autoridade desses órgãos federais, transferindo a responsabilidade do licenciamento para estados e municípios. Também anula partes da Lei da Mata Atlântica, flexibilizando políticas de combate ao desmatamento de florestas primárias e secundárias.
7.Desproteção de comunidades tradicionais: terras indígenas e territórios quilombolas não homologados deixam de ser consideradas áreas protegidas para efeitos de licenciamento. O projeto prevê a manifestação da Funai apenas em casos envolvendo aquelas com demarcação já homologada.
Em nota, o Instituto Socioambiental (ISA) indicou que há pelo menos 259 terras indígenas em processo de demarcação (equivalente a 32% da área total desse tipo de terra) que ficariam de fora da análise por ainda não estarem homologadas
8.Risco a sítios arqueológicos: o projeto restringe a atuação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que só poderá se manifestar se houver bens históricos já identificados no local.
9.Termo de referência: Para atividades e empreendimentos que dependam apenas de um termo de referência, com estudos menos complexos, a participação de outros órgãos dependerá de as terras, bens tombados ou unidades de conservação estarem próximos do local da intervenção no meio ambiente.
10.Produção indígena: Órgãos e autoridades ambientais poderão atuar para disciplinar procedimentos específicos para licenciamentos em que os interessados sejam indígenas ou quilombolas quando as atividades forem realizadas dentro de suas respectivas terras.
11.Unidades de conservação: Quando o negócio afetar unidade de conservação específica ou sua zona de amortecimento, o licenciamento não precisará mais da autorização do órgão responsável por sua administração (no caso federal, o ICMBio).
12.Mata Atlântica: A emenda aprovada exclui da lei de preservação da Mata Atlântica (Lei 11.428/06), a necessidade de autorização do órgão ambiental estadual para o desmatamento de vegetação desse bioma se ela for primária ou secundária em estágio avançado de regeneração.
Ainda retira a necessidade de autorização de órgão ambiental municipal para desmatamento de vegetação em estágio médio de regeneração desde que o município possua conselho de meio ambiente.
Agora, o projeto segue para sanção do Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que deve enfrentar pressão de ambos os lados para a sua tomada de decisão. A decisão será tomada meses antes da realização da Conferência do Clima, a COP30, que será realizada neste ano em Belém, no Pará.
O que pensam os ativistas ambientais?
Ao contrário do que defendem os apoiadores do projeto, entidades não governamentais anunciaram que, se sancionado pelo presidente, realizarão a judicialização da causa. O Observatório do Clima publicou em seu site oficial que o projeto vai contra o direito a um meio ambiente equilibrado, previsto na Constituição Federal. Além disso, apontou que o avanço do texto vai desenvolver uma série de conflitos e insegurança para empreendedores e investidores de diferentes setores econômicos e sociais.
A Fundação SOS Mata Atlântica e seus conselheiros também se mobilizaram contra o PL e a emenda. Essa argumenta que desde 2006, a Lei da Mata Atlântica foi responsável por uma queda de mais de 80% no desmatamento do bioma, passando de 110 mil hectares por ano para menos de 15 mil e que a revogação dos dispositivos que garantem essa proteção é abrir espaço para o aumento da destruição ambiental e ameaçar os compromissos firmados pelo Brasil nos acordos climáticos e de biodiversidade mundiais.
Além disso, apontam que uma decisão recente do Supremo Tribunal Federal por meio da ADI 7007, definiu que revogar mecanismos que exigem dupla autorização ambiental para o desmatamento na Mata Atlântica – com participação da União e dos Estados – é inconstitucional. Segundo a corte, essa mudança viola princípios fundamentais como a prevenção, a precaução, a vedação ao retrocesso e a garantia de um meio ambiente ecologicamente equilibrado.
“Alterar um sistema legal comprovadamente eficaz é institucionalmente temerário e juridicamente questionável, colocando em risco os compromissos assumidos pelo Brasil perante o Acordo do Clima e as COPs da Biodiversidade e do Clima”, defende a SOS Mata Atlântica.
Esse texto captou informações da Agência Câmara de Notícias, G1, CNN Brasil, SOS Mata Atlântica, Senado Federal e Observatório do Clima. O aprofundamento de questões como agenda climática, ESG, direito ambiental e outros, você confere nos cursos do Trilhante.